sexta-feira, 19 de março de 2010

A Porta

As trancas vão lenta e dolorosamente se movendo. Ela não sabe onde isso vai parar. Sente tanto medo, mas também empolgação. No peito a palpitação do novo antes dele chegar.
O estalo, o som que de tão baixinho recebe a maior atenção. O semblante tenso, os lábios apertados contra os dentes.

Um último e mais alto estalido.

Pronto! Está aberta!
Mas não basta que uma porta esteja destrancada para ser aberta. É preciso a coragem de dar o primeiro passo, e a inércia é tão sedutora...
O que está la fora já havia sido pintado tantas vezes por ela que já não sabia se devia evitar a provável maldade ou mergulhar na delícia do sonho.

Tinha medo. Mas fazia tanto tempo que ali estava, era seu lar e sua prisão. O conhecido, por pior que seja, tem lá seu aconchego. A novidade é a lâmina que roça na pele só para arrepiar a barriga.
A mão formigava, tremia porque formigava? O gesto, quase mecânico, fez os dedos delicados da menina sentirem a dureza do metal frio da maçaneta.

Nunca segundos foram tão duradouros. A cada milímetro deslizado para a esquerda era um arrepio na espinha. Os ombros e pescoço já se tensionavam à espera do pior, o coração pulava na expectativa do melhor.

Derrepente, naquele derrepente que nem ele mesmo sabe o momento certo que ocorreu, acabou-se a resistência, e só um leve empurrão já desenhou um feixe de luz geometrizado nas bordas da porta.
E o feixe foi se ampliando até se tornar o tudo que é branco existente nas folhas de papel, mas não por tempo tão prolongado. Só o suficiente para os olhos se acostumarem.

E lá estava, diante dela, o novo. Nem bom, nem ruim. Simplesmente o novo.

Um comentário:

  1. Hmm..como caracterizariamos essa peripécia?Tem aspectos de fábula, do melhor sentido. Eu diria que se trata de uma adorável metáfora que fala muito sobre "nós" enquanto pessoas, nós cada ser humano que vive e não se sente á vontade com mudanças.Tudo que é muito óbvio tem uma profundidade inimaginável, costumo pensar.

    Adorei as comparações, o desenlace, a coesão e a forma de soltar informações em blocos, camadas pra lançar-nos o fim. Entalando a verdade que não queremos ver em nossas gargantas.

    Oh sim, você é má, Loren.
    hohoho.

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